Estava longe de pensar que estaríamos sequer a discutir se devíamos colocar um relvado 100% artificial quanto mais que tal medida drástica já estava decidida.
Creio ser lógico, antes de tudo, reconhecer um conjunto de boas razões para que, na Europa do futebol de alta competição, apenas o Spartak Moscovo (onde, no Inverno, o frio mata qualquer matéria orgânica) e o Young Boys na Suíça, que se conheça, possuem relvados 100% artificiais. Explique-se então algumas:
- a razão "natural" - não deve haver mais de um jogador ou um departamento de futebol em cem, que prefira jogar em relvado sintético. Basta ter pouca experiência em cada uma deles para se saber como a bola, o contacto com o corpo, etc., têm uma relação muito mais confortável e fluída no relvado natural; Não é por acaso que os dos dois estádios que receberam menos jogos no Mundial da África do Sul foram os dois com relva sintética;
- O medo das lesões - Quando vemos jogadores profissionais a benzerem-se em triplicado tem muito a ver com a crença de se "protegerem" contra o grande receio das lesões. Mesmo que dados recentes indiquem que os artificias de última geração já não tenham maiores propensões para lesões graves do que os naturais, psicologicamente o receio não se desvanecerá tão cedo (demorará tempo e requer a generalização da prática). É na relva natural que têm cagança e confiança. Ainda recentemente o treinador do Tottenham recusou-se a a alinhar com o Ledley King - um grande jogador que tem sido perseguido por uma lesão grave que o impede de jogar todo o tempo - na deslocação ao estádio do Young Boys por temer que a relva sintética "o matasse" (sic).
- A desvantagem competitiva - habituados a jogar em relva artificial de cada vez que jogamos "fora", a relva pode tornar-se mais um elemento desfavorável ou mais uma desculpa para a derrota... É evidente que pouco nos interessa ter vantagem competitiva "em casa". Toda a gente sabe que, por todo um conjunto de variáveis, o Sporting (e os outros), desde sempre, ganha mais "em casa" e é portanto "fora" que interessa ganhar mais;
- a razão principal - Se, hoje em dia, já nem conseguimos convencer o Trézéguet a escolher o Sporting em vez do Hércules, quando passarmos a ter uma relva artificial garanto-vos que a nossa capacidade de persuasão não vai melhorar. E, neste capítulo, é bom que consigamos inverter o rumo.
Dito isto, a verdadeira questão oculta e que até hoje não vi ninguém responder é: já consultamos mais do que uma empresa? Já equacionámos, analisámos e testamos todos as soluções possíveis? Dá-me impressão que não. Não percebendo nada da matéria, dá-me impressão que antes da última geração da relva artificial haverá uma série de gerações de relva natural (ou combinada com sintético, como em alguns casos ingleses) por ensaiar.
Agora, sem que nos tivessem demonstrado que o nosso estádio é o único na Europa alérgico à erva natural (hoje em dia, no Sporting, ser diferente dá nestas coisas) e que não havia mais nenhuma solução possível, espero eu bem que, pelo menos, tenham tido a sensatez de terem auscultado e deliberado junto com os jogadores e departamento. Porque se não, que vão mas é dar banho ao cão.
Obs: a relva artificial foi uma excelente ideia para os clubes amadores ou de lazer que não têm como suportar financeiramente o tratamento de um relvado natural e que podem, com o sintético, dar-lhe uso constante permitindo novas fontes de receitas.
O futuro não vai ser relva artificial coisa nenhuma. Há coisas que, por mais que tentem, nunca serão tão boas como no seu estado natural.