domingo, 13 de fevereiro de 2011

Nem notáveis, nem sheiks: a democracia no Sporting

Ao longo das últimas semanas têm-se sucedido nos meios de comunicação social as notícias sobre reuniões entre "notáveis", putativas vagas de fundo e a autorização - sempre tácita - por parte da banca a essas candidaturas. Em todo este cenário falta sempre a coisa mais importante: os sócios e as eleições. Apesar de tudo, para a banca ou os notáveis poderem tomar conta do clube não o poderão fazer sem o apoio dos sócios do Sporting Clube de Portugal e sem lhes apresentar um programa. A pobreza do discurso dos candidatos, proto ou não, e dos media contrasta de forma absolutamente chocante com o espírito de debate e crítica - no melhor e mais democrático sentido do termo - que reina naquilo que podemos chamar de esfera pública leonina. Nas últimas semanas, mas também desde há muito tempo, personalidades como José Goulão, José de Pina, José Diogo Quintela ou Daniel Oliveira, entre outros, têm vindo a reflectir sobre a vida do clube de forma bastante interessante. Mesmo para lá destas figuras públicas a sensação com que fico ao circular pela blogosfera é que no Sporting conseguimos (e aqui acho que A Última Roulote, a par de muitos outros blogues, também contribuiu para isto) criar um espaço de debate sobre o clube que ultrapassa em muito a questão meramente desportivo-futebolística. Apesar de todos os problemas, foi nestes últimos anos de crise e em especial desde a primeira assembleia-geral no Pavilhão Atlântico em 2006, que se pôde observar a emergência, para responder a um estado de emergência, de uma vibrante e informada comunidade que debate de forma apaixonada a gestão do Sporting e o sentido da sua existência. Esta participação, e este espaço público, não se limita contudo às redes sociais e ao espaço mediático. Participei ao longo dos últimos anos em conferências organizadas por três grupos distintos. Desde um debate no hotel Barcelona organizado por pessoas próximas de Subtil de Sousa e no qual participou, por exemplo, Zeferino Boal, passando pelas iniciativas da AAS até ao Movimento Leão de Verdade penso que estamos - reafirmo a dimensão colectiva e comunitária deste processo - a transformar as formas de participação dos sócios na vida dos clubes. Claro que as roulotes, como os cafés da Europa Central onde Habermas situa as raízes da esfera pública burguesa, ou, numa analogia um pouco mais feliz, as tabernas da Inglaterra que E.P.Thompson considera fundamentais para a construção de uma identidade de classe entre os trabalhadores industriais do século XIX, são também espaços de socialização e produção de pontos de vista, tal como sucede nas bancadas do nosso estádio. Finalmente, temos as assembleias-gerais. Também elas passaram a ser bastante concorridas. Tornaram-se, contra a vontade das direcções e dos presidentes da mesa da AG, o espaço por excelência de reafirmação dessa filiação clubista e da importância que o Sporting tem nas nossas vidas.
Perante tudo isto, que não considero que seja coisa pouca, terá que surgir obrigatória e necessariamente uma alternativa credível ao projecto Roquette. Uma alternativa que não passe nem por notáveis paternalistas portugueses nem por sheiks das arábias ou oligarcas russos. A crise do Sporting e a tentativa de destruição da sua dinâmica associativa teve como efeito perverso - no melhor sentido do termo - criar esta dinâmica democrática cuja profundidade é relativamente original no contexto desportivo português. Tudo isto para dizer que surgiu mais um espaço de debate e reflexão sobre o Sporting Clube de Portugal. O Movimento Sporting Sempre. Tem entre os seus fundadores duas pessoas com quem já passei algumas horas a discutir o Sporting e que participam activamente na vida do clube: o José Gomes e o Miguel Lopes. Não sei se estaremos sempre de acordo, e nem sempre estivemos no passado, mas os pontos de encontro são muitos. Só nós é que podemos transformar o Sporting. Não são os notáveis, os sheiks ou os bancos que vão salvar o nosso clube.

Sem comentários: